quinta-feira, 24 de julho de 2008

Lotação I

Três horas da tarde. Eh Rio de janeiro bonito da gota. Mas visto daqui de onde vejo todo dia, o Rio é bonito, mas péra lá mermão, tem gente feia pra cacete. É central do Brasil. Acabo de ser espezinhada pelo mendigo no Campo do Santana. Mendigo é tudo revoltado, não aceita não como resposta. E porra, só tenho um cigarro, vou dar? Vou nada. A vida é dura meu filho, e você já devia saber disso. Mal sabia o que me esperava.

Chegamos na central, eu mais Camila, e essa não perde um trem, enquanto eu perco todos, ela nenhum. Fala feito uma gralha descompassada. Tenho por ela um carinho imenso, mas sofre de um mal terrível a coitadinha, chatisse. E quanta chateação ela sabe causar e bem sabe disso. Mas depois de lembrar o mendigo da condição dele, ninguém poderia deixar de me lembrar qual era a minha. Enfim anunciou a plataforma do bendito Santa Cruz. Num mulão só, veio aquele povo feio, manco, com as perebas de fora, e tudo na mesma direção.

E Camila, aquela mesmo que não perde um trem, grita:

- Corre!

Muito contrariada admito que corri, corri horrores, sebo nas canelas, pernas pra que te quero. Camila só gritava lá da frente. No meio das perebas, tava ela. A bichinha corre pra diacho. De repente caiu meu casaco. E eu besta, voltei pra pegar, ficou l’atrás.

Alguém me lembra da minha condição. Um homem de cecê que mais fedorento num pode existir, passa na minha frente. Ele, e o cecê que serviu mais pra esfregar a realidade nas minhas fuças. Nua, crua e fedida. O danado se vira ainda correndo e me diz em alto e bom som:


- Ah se ferrou! Vai ter que voltaaaar!


Parei de correr arrasada, como quem perde lugar no colégio, pra piolhenta da turma.

Mas Camila se adiantou é claro, aquela ali, não passa aperto, e acenava pra mim na porta do último vagão.

- Mari, guardei lugar, vem vem!!!

Lá pelas tantas, a vida me sorriu, e eu a ela.