segunda-feira, 5 de julho de 2010

Diálogos mortíferos


 A vida é a quase-morte.  Morte que acompanha meus passos, desde a minha nascença. Que em cada vão momento, firma sua presença.

“Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida’”. Já dizia Raul em Canto para minha morte, uma de minhas músicas prediletas.

Palavras que fazem um sentido danado quando a gente percebe que vive a vida a experimentar mortes, morrendo e nascendo vez após vez. Como que provando doses homeopáticas da morte, que estão na poesia, no “fim”, nos tantos fins que temos ao longo da vida. O Fernando Pessoa entra nessa conversa categórico como sempre, e desabafa:

“Aborreço-me da possibilidade
De vida eterna; o tédio
De viver sempre deve ser imenso.
Talvez o infinito seja isso...
Já o tédio de o pensar é horroroso”.
                                                        (Poemas dramáticos/Primeiro Fausto/Primeiro tema)

Viver para sempre é morrer e nascer eternamente, e convenhamos que  seria uma maçada. Eu preguiçosa que sou em número, gênero e grau só faria deixar tudo pro dia seguinte, sequer sairia do lugar. E pelo rumo da prosa chamo o Rubem Alves que considera a morte uma conselheira, que nasce conosco, se mantem a nossa esquerda, por que esquerda e não direita ou acima de nós eu não sei, mas enfim, e nos olha a todo instante até que um dia, quando bem quer, nos toca. E tudo o que chamamos de vida, é o intervalo entre o dia que nascemos e o dia do seu toque. Aquela que está sempre presente para nos lembrar que só O presente é o que há, e tudo mais é invenção.

...“Vem, mas demore a chegar eu te detesto e amo morte ”... Raul Seixas, ainda em Canto para minha morte, cismei com essa.

Viver consciente da morte,  é entender que a vida pede ida. Pra terminar deixo vocês com O Álvaro de Campos que pôs reticência no nosso diálogo.

...“Não, cansaço não é...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
É um domingo às avessas do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço por quê?
É uma sensação abstrata
Da vida concreta –
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angustia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...
Como quê? ...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola de outro, e voz dela!)

Porque ouço, veja
Confesso: É cansaço!” (Campos, Álvaro de; Ficções do interlúdio).






4 comentários:

  1. Esse texto é maravilhoso Mari! E tenho que concordar contigo, vivemos a vida a experimentar mortes, morrendo e nascendo vez após vez.
    Talvez seja isso que nos faça crescer e amadurecer.
    Mas parece um ciclo desgastante não acha?
    Rs...
    Bejin!!

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  2. É um processo lindo esse de "viver" e pra mim, na mesma medida que desgasta, também impulsiona . É claro que como tudo, é preciso ter olhos para ver que quando a gente chega ao fim do poço esse fim do poço nos serve como trampolim mór e daí já não vale mais lamentar ter chego ao fundo do poço. Me fiz entender? rsrsrsr, Começei e larquei mão,rsrsr. Te vejo no Paradoxo Essencial.Um grande abraço pra ti e apareça sempre!

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  3. Querida Mariana, adorei o titulo e o texto! Fundamentais para se entender a vida! Lembrou-me Roda Viva do Chico: “Tem dias que agente se sente como quem partiu ou morreu...” Muito bom passar pelo seu espaço e num se avexar nadinha, um balsamo!

    Obrigada.
    Abraço e beijo.

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  4. Bom tê-la por aqui também, bjos e até.

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